domingo, 9 de setembro de 2012

Sem choque... sem mundo... apenas o silencio... que cala meu sentir.



“Hamlet Meu fardo
me conclama e me torna cada artéria
tão rija quanto os nervos do leão
De Neméia. Outra vez ele me chama:
Largai-me, meus amigos; pelos santos,
farei fantasma a quem me detiver
larga-me, digo! - vamos, vou seguir-te

(saem fantasmas e Hamlet)

Horácio Ele se exalta na imaginação.
Marcelo vamos segui-lo. Não o obedeçamos.
Horácio Vamos. O que sairá de tudo isto?
Marcelo Algo está podre aqui na Dinamarca.”

Estou assim, como Marcelo, sentindo um cheiro que não tem lugar, aliás, sempre gostei desta passagem em Hamlet, mas nunca me fez um sentido até então, pois achava que gostava, por ela ser a menção de um problema longe de mim. Porém, tenho uma ligação muito forte com a Dinamarca, ou mais carinhosamente chamada de Danmark. Desde meus 15 anos, tenho contato com um casal de senhores dinamarqueses, que na ultima vez que os visitei, por temer ser a ultima oportunidade de reencontrá-los em vida, eles me apresentavam para todos os vizinhos como sendo o “filho brasileiro”. A Troels, minha mãe dinamarquesa, fez meu doce de morango dinamarquês favorito, não que eu tenha comido muitos, mas foi o que ela fez da ultima vez que passei por lá.
Na realidade esta passagem me diz de algo próximo, de algo que é meu, mais que de qualquer um.
Mais que cheiro, eu sinto que não vibro, que há um silêncio, há algo estranho dentro de mim. Nada reflete, nada encaixa, apenas os movimentos na musica. Na formalidade de meu comprometimento com o projeto e nada mais.
Minha reflexão começa há alguns meses atrás, quando uma amiga me pergunta:
- Ti, você está sentindo algo estranho? Então respondo, o que eu tinha para aquele momento, mas não era somente aquilo que eu estava sentindo, era a discriminação sentimental possível. Ela que levanta a ideia que refletia dentro de mim, a falta de vibração.
- acho que tem ligação com o tema desse ano. Nossa conversa não foi muito adiante, mesmo porque estávamos no horário para entrar. Neste mesmo dia, houveram duas outras coisas. A primeira foi a dificuldade de entrar na Club (neste momento, me questionei se era somente a questão física ou não). Senti-me isolado, para fora, mas até ai, acreditava que poderia ser a minha maneira de ser, de ser reservado, de ser fechado.
Mais tarde, depois de um encontro sem ensaio propriamente dito, e depois de muita conversa, de reviver o momento que "Pretty Woman" foi apresentada como sendo o tema da proxima apresentação, justamente quando estava num momento tenso com minha mãe e que hoje, não estou mais, sempre resignificando, até que, um amigo me pergunta.
- Tiago, você está muito calado, o que acontece?
- não sei, ainda estou muito confuso. Referia-me sobre o silêncio que estava dentro de mim.
Na mesma semana, mudança de horário. Tive que mudar um pouco meus planos, podendo participar apenas como uma metade de mim. O que me deixou mais encucado. Estava ficando mais distante.
Algo que deveria vibrar e não estava vibrando, não tinha raiva ou amor, ou qualquer coisa e assim foi nos ensaios, apenas a técnica, uma perna, um braço, posse. Isso não significa que não brinquei, ou me diverti, mas algo me faltava. Minha vontade está sem vibração, como se estivesse sendo abandonado de lado, assim, como deixamos aquele brinquedo que tanto gostavamos de lado por não fazer mais sentido... mas o que deixou de fazer sentido?
O pior sentimento é a indiferença, mas porque estaria indo para esse sentido? Normalmente, acontece quando me defendo de algo que possa me ferir... mas o que estava me ferindo? Seria o fato de não “existir” mais "Santa Club"? Com o punho erguido. O que aconteceu de um tempo para cá? O que aconteceu que não reflete dentro de mim? Que fuga é essa que preciso me colocar indiferente, repetindo os movimentos sem uma emoção sequer, apenas no ritmo, sem deixar a emoção apoderar de mim.
Na sexta-feira do feriado, tive um encontro, fui ver um filme de dinossauro com uma amiga muito querida, e o filme era ruim, mas o reencontro fez algo vibrar em nossa conversa, entre nosso contato, que me levou a escrever este texto, pois percebi que estava abandonando parte de mim, que não consegue seguir em frente... e o que fazer para recuperar esta outra parte? Quais fantasmas preciso enfrentar para conseguir sentir novamente? Seria o medo de meus “pais dinamarqueses” morrerem e, com isso, eu deixar de existir na Dinamarca?
Ou como O Teatro Mágico diria: "enquanto houver você do outro lado/ Aqui do outro eu consigo me orientar". Estou sem oriente, sem orientação, talvez, por não sentir, por ser tomado pelo silêncio, pela falta de reverberação em mim, algo que antes não havia. Não tem a tensão da arte, apenas da técnica e o abandono de algo que me foge, que me silencia que me entristece, que me faz repetir os movimentos, somente por repeti-los, e não por amar ou odiar aquele movimento, não é o chão, ou o pular, é apenas um mover sem sentido.
Curioso comportamento, acabei de sentir um aperto no coração, mandei um e-mail para Addy and Troels (meus pais dinamarqueses) perguntando como eles estão, algumas lágrimas ensaiaram a sair, desde o começo do ano, não falo com eles e esse texto me impulsionou a escrevê-los e um sentido se fez, a "Saudade". E qual é o sentimento que estou na dança?? Nos movimentos da vida?... no abandono de mim mesmo em busca de minha exatidão, no abandono para não sentir o aperto no coração de não ter noticias de pessoas que foram importantes, de pessoas queridas, no abandono de mim para terminar logo, no abandono de mim.... de mim... de eu mesmo... no silencio... sem eco... sem retorno... ou no barulho... sem escuta... seja no silencio ou no barulho, o que deveria aflorar ficou ali, preso em minha caixa, que temo abri e prendo Pandora para ela também não abri-la.

A esperança é incerta e o processo pode ser mais doloroso do que posso realmente aguentar. Os reencontros é o que estrutura uma boa ou má relação, neste momento percebo que deixei muitos contatos que poderia ter mantido, mas também faz sentido deixarmos de lado, assim como faz sentido lutar por outros contatos, assim como também brigar por eles e com eles... Qual é o reencontro que preciso acontecer...